1 de jul. de 2010

Borbogarta ou Lagarleta

Fiz um pequeno furo e olhei para fora.
Nem sei como consegui abrir esse buraquinho minúsculo. Afinal, sou larva. Não tenho dedos. Mas tenho olhos que as poucos acostumam-se à luz que invade o casulo. Luz gostosa. Traz calor.
Como meu mundo de lagarta só tinha referências rastejantes, foi difícil para mim identificar o que via enquanto estava ali, no alto daquela árvore, onde colei-me para poder hibernar e trasnformar-me.
Busquei uma árvore enorme, frondosa, acolhedora. Fiz meu casulo com esmero, com qualidade total. Sou uma excelente construtora. Só esqueci de colocar uma janela para fora. Por isso investi um tempo incontável em fazer esse furo. Mas fiz. E enxerguei o mundo lá fora. Tudo é grande. Tudo é alto. É preciso ter asas fortes.
Ei, espere um pouco. Pelo buraco que fiz no casulo, alguém também me olha. Quem será o dono deste olho que se perde tentando ver o que acontece no casulo? Sou eu mesma, com meu olhar de borboleta.
Nossa! Um furo. O que haverá dentro dessa casulo? Haverá vida? Haverá cor? Haverá inteligência? Olho pelo furo. Não é possível enxergar lá dentro. Escuridão. Beijo apenas um par de olhos que me olha. Os mesmos olhos azuis que são os meus.
Lagarta e borboleta. Sou uma e sou outra. Sou as duas. Uma olhando a outra e aprendendo, desvendando, explorando. Lagarta virando borboleta. Borboleta perdendo a magestade. Dura pouco. È preciso um novo casulo, uma nova construção.
Frente a frente somos apenas uma. Borbogarta. Lagarleta. Amalgamamos. Um faz parte do outro que faz parte do um. O pequeno furo é o que nos separa. Um mero futo que permite ver de dentro para fora e de fora para dentro. Um pequeno furo. Brecha no olhar. Brecha na carapaça. Casulo semi-pronto para o rompimento. Então sobre o furo. Amadurece o furo. Ameaça o furo. Sorri o furo.
Um e dois. Dois e um. Abre e fecha. Começo e fim. Bate as asas borboleta. Voa. Recolhe-te e economiza energia, lagarta. Junta tuas forças para romper o casulo.
Voa. Rompe. Mistura. Vive. Embeleze. Encante. Bata asas. Estique-se. Borboleta, em sua efêmera vida, voce pode tudo. Lagarta, em sua longa espera, você pode tudo.
Dois, um. Um, dois. Espelho. Reverso de mim.

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